Axiologia Educacional                               

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Textos e leituras complementares

(registo de ideias à margem/em complemento das aulas)

 

1.   Polaridade ou gradualidade?

9º. Os valores têm matéria, polaridade e hierarquia.

(...) A polaridade é a propriedade que têm todos os valores de se contraporem num pólo positivo e num pólo negativo. À beleza contrapõe-se a fealdade, à generosidade a mesquinhez, à santidade a profanidade. A este respeito, convém observar que a palavra valor costuma ir pejada de um sentido positivo, de preferência ao negativo. Dir-se-ia que o génio da língua resiste à aplicação da palavra valor a coisas como a mesquinhez e a fealdade. Na realidade, porém, valor é tudo aquilo sobre o qual recai o acto de estimar, positiva ou negativamente; e embora a palavra estimar contenha também um matiz preferentemente positivo, é notório que a sua significação estrita é a de perceber um valor, quer positivo, quer negativo. Não obstante, talvez fosse aconselhável forjar um vocábulo, por exemplo, a palavra «desvalor», para designar o valor negativo. É possível que noutra ocasião façamos uso desta faculdade.

MORENTE, Manuel Garcia, Ensaios sobre o progresso

               A defesa de que a "polaridade " é uma característica estrutural dos valores é pacífica no quadro de uma ontologia dualista, de uma concepção da realidade em que a mesma seja a expressão de forças de sinal oposto, uma positiva e outra negativa. Assim, os valores correspondem à primeira e os tais "desvalores" à segunda. O dualismo ontológico foi historicamente dominante na tradição filosófica e cultural do Ocidente. Tende-se geralmente a atribuir a origem disso ao Cristianismo e ao facto de ele ter estruturado essa tradição. Na verdade, o dualismo, antes de ser cristão,  é um traço fundamental da cultura grega desde o orfismo-pitagorismo ao platonismo. Depois, no seu período de formação e definição doutrinal o cristianismo foi moldado por essa raíz grega através, designadamente, do neoplatonismo. Por outro lado, foi-o também pelo maniqueísmo e por outras influências religiosas orientais. Em Santo Agostinho, 400 anos depois de Cristo, ainda se procura uma síntese entre essas componentes da cultura antiga com a mensagem cristã.

               Ora, nessa perspectiva dualista, valores positivos serão o oposto de valores negativos e poderemos mesmo falar de "desvalores" e até de "antivalores". A luta entre o Bem e o Mal, entre a Luz e as Trevas manifestar-se-á naturalmente na polaridade dos valores.

               Pelo contrário, uma ontologia monista só pode encarar quer o plano da realidade quer o dos valores como palco da expressão do Ser e do Valor. O que sucederá nesta perspectiva será, simplesmente, que haverá a manifestação em maior ou menor grau seja da realidade seja do valor. No campo axiológico diremos que, de um ponto de vista monista, o que caracteriza estruturalmente os valores não é, então, a polaridade mas a gradualidade ou gradabilidade , ou seja, o facto de os valores sempre existirem, se realizarem, se darem, em um grau mais ou menos elevado. Em vez de um oposição entre Beleza e Fealdade, como se elas alguma vez existissem realmente na sua pureza absoluta, teremos a realidade habitada/povoada por mais ou menos valor estético. Quando consideramos que o é num grau acima da mediania falaremos de Beleza e, pelo contrário, quando o grau for abaixo dessa linha média, de Fealdade. Mas nem a Beleza nem a Fealdade são absolutas, e o que teremos é menos ou mais valor estético.

   Acerca do Maniqueísmo

[Maniqueu] (...) nascido na Pérsia, no século III, fundou  uma religião, o maniqueísmo (...). A religião maniqueísta se difundiu pelo Império Romano e pelo Ocidente Cristão. O maniqueísmo combina elementos do zoroastrismo, antiga religião persa, e de outras religiões orientais, além do próprio Cristianismo. Possui uma visão dualista radical, segundo a qual o mundo está dividido em duas forças: o Bem (luz) e o Mal (trevas) como entidades antagônicas em perpétua luz. Luz e trevas no sistema maniqueísta não são figuras retóricas, são representações concretas do Bem e do Mal. O Reino da Luz e o Reino das Trevas estão em permanente conflito.

- continuação do texto   aqui 

Características Gerais do Neoplatonismo

       [No Neoplatonismo ] Será acentuado o dualismo platônico entre sensível e inteligível, entre matéria e espírito, entre finito e infinito, entre o mundo e Deus: primeiro, identificando, por um lado, a matéria com o mal, e elevando, por outro lado, o vértice da realidade inteligível ao suprainteligível e, em segundo lugar, elaborando uma moral ascética e mística, em relação com tal metafísica, a qual, todavia, se esforçará por unificar os pólos opostos da realidade, fazendo com que da substância do Absoluto seja gerado todo o universo até a matéria obscura.

- continuação do texto aqui


2.  Acerca da noção de perfil axiológico :


            É inegável a diversidade humana: todos temos consciência de como os indivíduos, os grupos, as sociedades e as épocas diferem muito entre si. Tratamos habitualmente de atribuir essa diversidade a causas sociológicas/sociais, psicológicas/psíquicas, históricas, culturais, civilizacionais, etc. Assim explicamos o “conflito de gerações” ou o “choque de civilizações”. A nossa preocupação em explicar a génese da diversidade deriva - como a generalidade dos nossos esforços de racionalização - da necessidade de contermos em limites compreensíveis (controlados) aquilo que nos perturba enquanto não o conseguimos explicar. E assim é que o mais comum é passarmos à explicação e à justificação sem cuidarmos suficientemente da atenção e da compreensão dos dados e dos fenómenos, neste caso, do fenómeno iniludível da diversidade axiológica.

Do ponto de vista da Axiologia (da Axiologia Geral, para sermos mais precisos, já que no caso da Axiologia Educacional o problema não se põe exactamente da mesma maneira) o nosso objectivo não consiste em apurar, determinar, conhecer a causa ou causas dessa diversidade, mas sim em constatar, compreender, analisar essa paleta multicolor característica do mundo axiológico. Sem pôr em causa que se possa e deva indagar sobre o que subjaz e determina essa diversidade, a nível histórico, cultural, social, psicológico, etc., a Axiologia Geral trata simplesmente de identificar e compreender o seu quê e não o seu porquê . Decerto que a educação desempenha um papel importante na constituição, formação e alteração de um dado perfil axiológico, mas, ao nível da Axiologia Geral não está em causa como ele se “fabrica” e simplesmente a percepção e compreensão do que o caracteriza. Diríamos que se trata de nos dispormos a uma análise axiológica, análise distinta da análise psicológica, sociológica ou antropológica. Tratamos de compreender o que define um determinado “sistema de valores”, ou seja, um perfil axiológico. Um herói/personagem da banda desenhada, do cinema, da literatura ou da história, do passado ou do presente, da realidade ou da ficção, um indivíduo, um grupo ou uma entidade mais vasta podem ser considerados aqui Podemos falar de “perfil axiológico” tanto em relação a pessoas quanto a entidades ou até a produtos culturais individuais ou colectivos como sejam as ideologias (o guterrismo, o cavaquismo, o soarismo, o pintasilguismo ou o salazarismo, dando como exemplo a política portuguesa). Podemos ainda através da análise axiológica traçar o perfil de uma determinada publicação periódica ou aperiódica, de uma editora, de um grupo musical ou de uma companhia teatral, de uma associação ou de uma agremiação de algum tipo (da SOIR Joaquim António de Aguiar aos Mão Morta, à Maçonaria, ao Bloco de Esquerda ou um outro Partido seja ele o X ou ou oY).

Chegaremos à definição do perfil axiológico procedendo à escalpelização, à autópsia axiológica, à análise sistemática de um dado “objecto” considerando-o em termos axiológicos ou seja enquanto sistema de valores, enquanto uma forma determinada de hierarquização das diversas ordens de valor e enquanto sistema de vivência prática desse sistema.

Por esta via nos habilitaremos a desenvolver uma nova sensibilidade perceptiva, a sensibilidade axiológica, caracterizada não pela perspectiva etiológica ou genética mas antes por uma perspectiva mais descritiva e analítica em que os fenómenos valem pelo que são enquanto manifestações sem cuidarmos de averiguar o que neles se manifesta. E se alguma espécie de julgamento axiológico chegar a ser legítimo ele só o será com base numa madura e aturada reflexão informada por uma exaustiva análise da realidade axiológica na sua diversidade e na sua riqueza plural.

A análise axiológica conduzir-nos-á à percepção de um perfil axiológico isoladamente ou através de uma análise comparativa.

A título de exemplo: o perfil axiológico de James Bond, do Tio Patinhas, do Fado, do Blues, do Obelix, do Pikatchu, de Homer ou Lisa Simpson, da Mafalda ou do Superhomem, de Godot ou de Mufassa, da Barraca ou dos Heróis do Mar, de Wagner ou da Anita, de um dos Três Porquinhos ou de todos eles, de Nelson Mandela, de Salazar ou de Gandhi, do Raichu ou do Shinchan, de Pasteur, de Edison, de Napoleão ou de Einstein, de um criador artístico ou de uma sua criação, de Brecht ou da Mãe Coragem, de Picasso ou da Guernica,… enfim, um perfil ou um conflito entre perfis axiológicos.
                

 Casimiro Amado, 2004



3.   Um erro frequente: a redução dos valores aos valores éticos e da Axiologia à Ética

                Não é só no discurso quotidiano que a confusão se faz. De facto, um dos principais problemas que "atacam" a generalidade dos escritos acerca da Axiologia, dos valores e, também, da Axiologia Educacional, consiste na lamentável confusão entre Valores e Valores Morais. Assim, a Axiologia acaba por ser reduzida à Ética/Moral e a Axiologia Educacional parece ter por objecto simplesmente a educação moral, a educação para os valores éticos.  Desta redução resulta um extraordinário e lamentável empobrecimento da Axiologia e da Axiologia Educacional. Imaginemos uma situação hipotética em que na educação se promove o desenvolvimento axiológico no âmbito de todas as restantes ordens de valores com excepção dos éticos. Será que não estamos nesse caso perante uma autêntica educação para os valores?! A julgar por muitos dos textos que se produzem nesta área, julgaríamos que educação axiológica é sinónimo de educação moral... de tal forma se  exemplifica sempre com o domínio da ética quando se quer falar de valores. 

 

Sugestões de Leitura na Internet:


 4Valores Práticos

1. Leitura sugerida:

"Manifesto contra o trabalho" pelo Grupo Krisis

2. Que educação para o trabalho? /Que educação para o consumo? ?

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